quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Maria levantou-se e partiu apressadamente

Maria levantou-se e partiu apressadamente"


por: Carlos Alberto Lopes Pereira
artigo publicado a 1 de setembro 2023 no jornal diário "Correio do Minho"

Terminei a minha última crónica, publicada no dia 21 de julho passado, com uma frase de Fernando Pessoa: «Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido» para recordar que até as coisas pequenas justificam a nossa razão de existir, manifestando a minha esperança nas virtudes da JMJ, cujo ponto de partida estava expresso no lema que o Papa Francisco escolhera para Lisboa «Maria levantou-se e partiu apressadamente», retirado do Evangelho de São Lucas (1, 39), recordemos que, no final da Jornada do Panamá, em 2019, o Papa anunciou que a próxima Jornada seria realizada em Lisboa. O Santo Padre quis estabelecer uma linha de continuidade entre o Panamá (episódio da Anunciação do Arcanjo a Maria) e Lisboa (episódio da Visitação de Maria a sua prima Isabel), por isso escolhi esta citação bíblica para o título desta crónica.

No final da Missa de envio o Papa Francisco manteve a tradição de anunciar, com o desafio: «Vemo-nos em Seul, em 2027!», que a próxima JMJ se realizará na capital da Coreia do Sul, daqui a quatro anos. Claro que todos sabemos dos problemas de saúde que o Papa tem manifestado, e muitos se têm questionado sofre a sua presença JMJ de Seul em 2027. Contudo o próprio Papa já tomou posição pública, quando em 31 de julho de 2016, na Missa de envio fez o anúncio da escolha da cidade do Panamá, para 2019, tendo acrescentado: «Não sei se vou estar no Panamá, mas Pedro estará».

É este olhar para a frente com confiança no futuro, na certeza que todo e qualquer problema terá a sua resolução, independentemente dos protagonistas terrenos, porque o Papa confia no Mestre quando este diz «O meu reino não é deste mundo.» (Jo 18, 36). Este foi o testemunho que os jovens peregrinos puderam sempre presencial naquele homem marcado por uma vida com muito sofrimento, mas que sempre tem um gesto, um sorriso ou um olhar de carinho e de conforto pra todos aqueles que o seu olhar alcança.

Tive o prazer de poder estar como voluntário nestas jornadas e ver uma outra face da mesma moeda e, por isso, só participei no encontro do Papa com os voluntários no encerrar da Jornada. É certo que os três turnos diários de trabalho de oito horas, quase sempre evoluíam para dois e por vezes três, primeiro porque não havia assim tantos voluntários nas “catacumbas” da Universidade Católica em Lisboa, leia-se, no piso menos um da garagem da UCP, e em segundo porque quando havia algumas folgas, sempre as cedíamos aos mais jovens porque entendíamos, os mais velhos, que a eles, neste tempo, não se poderia nunca aplicar o célebre ditado popular: «ir a Roma e não ver o Papa».

Sinto que foram dias de muito trabalho, com pouco tempo para descansar, mas no dia seguinte ao ouvirmos as histórias daqueles puderam usufruir dos seus turnos de descano, e ver a alegria de um encontro ainda que muito distante ou a fotografia do Papa tirada com o telemóvel, quando este passava no papamóvel, sem vidros de proteção, sentíamos que contribuíamos para a felicidade daqueles jovens que se entregaram a um serviço, para que os “jovens peregrinos” pudessem ser verdadeiramente peregrinos. Quantas vezes recordamos o pensamento que Baden-Powell nos deixou na sua última mensagem: «Mas o melhor meio para alcançar a felicidade é contribuir para a felicidade dos outros» (Escutismo para Rapazes, p. 303), provamos, como se costuma dizer “a cores e ao vivo”, o delicioso sabor deste pensamento do fundador do escutismo.
No encontro do Papa Francisco com os voluntários, também eu tive a oportunidade de o fotografar quando o papamóvel passava a metro e meio da barreira à qual me encostara, para descansar. Só então percebei a verdadeira dimensão do sentimento que os jovens diariamente nos tentavam descrever.

Apreciei muito a intervenção do Santo Padre, de linguagem simples, mas direta e interpelante, manifestando uma profunda gratidão pelo serviço prestado, mas todos nós nos sentíamos carinhosamente orgulhosos pela pessoa que nos dirigia tais palavras, sobretudo porque nós fomos uns felizardos por nos terem proporcionado tão bela oportunidade.
Finalmente, ainda neste encontro, mas sobretudo por ser nos dias de hoje, foi emocionante ver os voluntários, sempre que passavam pelas forças de segurança, bater-lhes palmas como sinal de reconhecimento e gratidão pelo trabalho desenvolvido, senti-me honrado por ter sido um voluntário neste jardim à beira mar plantado e dei comigo a pensar que, a final, o Fernando Pessoa tinha razão.



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