sexta-feira, 22 de maio de 2020

O Acampamento Escutista em Tempos de Pandemia



O Acampamento Escutista em Tempo de Pandemia

por: Carlos Alberto Lopes Pereira
artigo publicado a 22 maio 2020 no jornal diário "Correio do Minho"


«O Acampamento é a grande atração que chama o jovem para o escutismo e oferece o melhor ensejo para o ensinar a confiar em si próprio e a cultivar a iniciativa, além de contribuir para o seu robustecimento.»

Baden-Powell, in Escutismo para Rapazes, 2007, p. 139.

 

Nestes tempos de pandemia em que o confinamento se vai paulatinamente aliviando, mas com o sol ”quentinho” dos finais de maio, que nos tem visitado, parecendo convidar-nos para a realização de atividades próprias dos finais de primavera e que se multiplicam pelo verão:

· A uns, é o chamamento do perfume da maresia, transportado pela brisa que parece embrenhar-se pelo interior, desafiando-nos disfrutar da praia.

· A outros, é a harmonia dos diversos perfumes do campo, da floresta ou da montanha que, assemelhando-se ao “canto das sereias”, nos lançam um desafio irresistível para calçar as botas, pegar na mochila, caminhar e acampar em plena natureza.

Este chamamento para acampamento, a atividade educativa de excelência do escutismo, leva-nos, sob o ponto de vista emocional e com a natural nostalgia do passado, a imaginar/planear mentalmente um fim de semana em campo. Mas, por outro lado a racionalidade e o sentido cívico chamam-nos à realidade, esta realidade que hoje vivemos e ao desígnio comum a que somos chamados: contribuir, usando os “talentos” de cada um, nesta luta da humanidade para vencer a pandemia que, diariamente, a todos atormenta.

O sofrimento de tantas pessoas e famílias que sofrem por causa dos “seus doentes”, outras sofrem pelas consequências gravíssimas que resultam deste “pecado original” que é a pandemia e, finalmente, todas as pessoas que estão na frente de ataque e este “invasor” invisível. Assim, somos obrigados a resistir à tentação, para não acrescentarmos mais dor à dor que todos carregam até que a verdadeira normalidade seja restabelecida.

Neste contexto, tomamos consciência que os próximos acampamentos serão muito diferentes daqueles a que estamos habituados. A Igreja em Portugal, pela voz da Conferência Episcopal Portuguesa, tanto no comunicado do seu de Conselho Permanente, de 02 de maio, como nas orientações para a celebração do culto público católico no contexto da pandemia Covid-19, de 08 de maio, com a sua sabedoria secular, demonstrando uma prudência que a leva a pensar mais nos outros e tendo a humildade genuína de reconhecer os perigos e a inexistência de soluções definitivas, de entre as muitas orientações produzidas, numa delas, suspendeu os acampamentos. Esta decisão deve interpelar, antes que seja tarde, todos os escuteiros, mas, de um modo especial, os seus dirigentes.

Claro que as autoridades competentes: saúde, proteção civil e forças armadas e de segurança, deverão elaborar um guião apropriado, como tem vindo a fazer para outras áreas. Mas também o escutismo deve produzir a sua reflexão e, em função desta, verter para o manual “Normas de Acampamentos” e orientações complementares, o resultado destas reflexões, produzindo assim a sua adequação aos novos tempos.

 

Será qua a “tenda de patrulha”, que alberga de 4 a 8 jovens, vai resistir ao “reinado” da Covid-19, ou se passaremos a utilizar tendas individuais, para respeitar o distanciamento de proximidade?

Como será a organização e o funcionamento de um “acampamento de Patrulha” e a realização de tarefas comuns? Como será mantido o princípio pedagógico onde o menos experiente aprende com o mais experiente?

Como manteremos o trabalho colaborativo entre pares, neste pequeno grupo (a Patrulha) em campo?

Que infraestruturas serão exigidas em campo? Será que poderão ser construídas pelos jovens, recorrendo a técnicas de pioneirismo, ou outras, desenvolvendo assim as suas capacidades de conceção e criação, de planeamento e de execução? Mantendo-se o acampamento como um verdadeiro centro de autoeducação pela ação e para o serviço?

O fundador deixo-nos este conceito: «a natureza é, simultaneamente, um laboratório, um clube e um templo», que será “reduzido a pó” se o acampamento escutista passar a ser um acampamento “de plástico” ou do tipo “prêt-à-porter. A Natureza não é sempre igual, nem sequer no mesmo local e na mesma época, ela tem vida e é esta vida que nos leva a constantes desafios que nos exigem permanentes adaptações e aprendizagens, em fim, proporcionam-nos sempre novas vivências entusiasmantes e enriquecedoras, contribuindo para a autoformação do cidadão solidariamente ativo à luz da fé professada.


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