Carlos Alberto Pereira |
Saudação Escutista
A tua saudação [escutista] mostra apenas que és pessoa honesta e que queres bem aos outros.
Baden-Powell, in, Escutismo para Rapazes, p.45.
Há dias ia conversando com um amigo pela zona pedonal quando, surgiu um amigo comum que a ambos cumprimentou e, depois de uma breve conversa de circunstância sobre o tempo e a saúde, seguiu, em passo apressado o seu destino. O meu amigo, um pouco a medo, perguntou-me porque me tinha o Pedro cumprimentado com a mão esquerda.
A resposta foi fácil e pronta - é que o Pedro, tal como eu somos escuteiros e esta é a nossa forma de cumprimentar, entre nós. Contudo fiquei com a sensação que faltava uma explicação para esta especificidade própria do escutismo que, depois de partilha do momento, agora reproduzo com os estimados leitores.
Normalmente, quando não estamos uniformizados, como aconteceu na situação que deu origem à questão, os escuteiros cumprimentam-se com a mão esquerda, cruzando entre si o dedo mínimo. Este ato contém, em si mesmo, um significado muito forte do escutismo: “que os escuteiros são irmãos de todos os outros escuteiros” e que todos integram “a fraternidade mundial do escutismo”, é, portanto, um ato de assunção pública estes valores escutistas.
O facto de se utilizar a mão esquerda é para marcar ainda mais a presença da “Amizade”, pois é feita com a mão que está mais próxima do coração, que simbolicamente representa a fonte do Amor. A mão direita, ao ficar livre permite-nos, no processo simbólico, estar preparados para defender e ajudar o outro. Diz-se que Baden-Powell colheu esta ideia, numa tribo, na sua campanha militar na África do Sul.
Quando estamos uniformizados este cumprimento é completado com uma saudação, quando não temos a cabeça coberta, com chapéu, boina ou boné, com a mão direita que se eleva à altura do ombro, ficando os dedos indicador, médio e anelar juntos e em extensão, e o polegar fletido sobre o mínimo (mindinho ou mendinho). Também aqui há uma carga simbólica para esta coreografia dos dedos da mão direita, os três dedos, juntos e em extensão recordam-nos, por um lado, os três artigos da Promessa Escutista:
«Prometo, pela minha honra e com a graça de Deus, fazer todo o possível por:
• cumprir os meus deveres para com Deus, a Igreja e a Pátria;
• auxiliar o meu semelhante em todas as circunstâncias;
• obedecer à Lei do Escuta.»
E, por outro lado, simbolizam os três Princípios do CNE:
«1º. O Escuta orgulha-se da sua Fé e por ela orienta toda a sua vida.
2º. O Escuta é filho de Portugal e bom cidadão.
3º. O dever do Escuta começa em casa.»
Finalmente, a posição dos outros dois dedos, o mínimo e o polegar, onde o polegar se sobrepõe ao mínimo, parecendo segurá-lo, é a metáfora de “o mais forte ajuda o mais fraco” ou ainda a lembrança da “Boa Ação” quotidiana.
Os Lobitos (crianças dos 6 aos 10 anos) saúdam da mesma forma, mas estendendo apenas os dedos indicador e médio, os quais ficam afastados formando um “V”; os restantes dedos ficam fletidos, o polegar sobre os outros dois. Os dedos em “V” simbolizam as orelhas do lobo que escuta, que está atento e que vê, desta forma, para além do que a vista alcança. Esta atenção é vital para o seu percurso educativo e para a sua aprendizagem, isto é a sua autoformação enquanto cidadão, ainda que de tenra idade.
A Saudação Escutista, ajuda crianças e jovens que entram para o Escutismo, a assumir as suas diferenças e o seus valores, sem medos, mas com a convicção de que não estão sós e que, uns com os outros, vão trilhando caminhos que os levam à construção de uma personalidade forte, nas convicções e nos valores, sempre em caminhos de serviço aos outros, numa relação com ele próprio, com os outros, com a natureza e com Deus, numa construção gradativa do cidadão do amanhã.
Carlos Alberto Lopes Pereira
artigo publicado a 9 novembro 2019 no jornal diário "Correio do Minho"
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