sexta-feira, 22 de abril de 2022

Fraternidade Mundial Escutista

por: Carlos Alberto Lopes Pereira

artigo publicado a 15 de abril 2022 no jornal diário "Correio do Minho"


Se nos fizermos amigos dos nossos vizinhos estrangeiros e se essa amizade perdurar, não precisamos de lutar. E esse é incontestavelmente o melhor meio para impedir futuras guerras e de assegurar uma paz duradoura.
B.P., Escutismo para Rapazes (p.321)

A preocupação pela paz foi tomando, de forma gradativa em função das idades de cada Secção, cada vez mais importância neste movimento de educação não formal, pautado pelo método escutista como caminho para a autoeducação de crianças e jovens.


O conceito de Fraternidade Mundial Escutista, espaço onde se integram os escuteiros de todo o mundo, com a missão de serem «os embaixadores da amizade, que se dedicam a criar amigos e a abater barreiras erguidas pela cor, credo e classe social» e o fundador continua: «Aconselho-vos a que façais o que puderes neste campo, porque não tardareis a ser homens, e se surgirem desavenças entre quaisquer nações, é sobre vós que cairá o peso da responsabilidade.


As guerras ensinaram-nos que, se uma nação tentar impor a sua vontade às outras, estas reagem com violência. Uma série de Jamborees escutistas [acampamentos mundiais de escuteiros] e outras reuniões de escuteiros de muitas nações ensinaram-nos que, se praticarmos a tolerância mútua e dermos e recebermos de igual para igual, haverá compreensão.»


Este trecho do “Escutismo para Rapazes” (pp. 322 e 323), publicado em 1908, parece ter antecipado algumas das ideias-chave presentes na Evangelii Gaudium quando nos estimula a sairmos da nossa zona de conforto e a irmos ao encontro de todos. É um dinamismo “em saída” ao encontro dos irmãos, tendo como bússola, a Palavra do Senhor, o fogo do Amor, para ajudarmos a materializar o desígnio de Deus: «a fim de que todos sejam um» (Jo 17, 21). Tal como na Fratelli Tutti, onde o papa, bem ao jeito de São Francisco de Assis, nos pede para nos comprometermos com as irmãs e os irmãos de outras Igrejas, os fiéis de outras religiões e de todas as pessoas de boa vontade, constituindo a fraternidade universal com amor, sem exclusões, que tudo e todos devem abraçar. Assim se constrói a fraternidade universal onde todos e em todos os lugares se escuta com atenção, se aprende uns com os outros e se constroem decisões juntos.


Baden-Powell compara a nossa vida a um caminho, vincando que: «por caminho não quero significar um caminhar ao acaso, sem finalidade, mas antes um trajeto agradável com um objetivo definido, ao mesmo tempo que há consciência das dificuldades e perigos que podem deparar-se no percurso» e «A vida seria aborrecida se fosse toda de rosas; o sal tomado só é amargo; mas dá sabor agradável à comida. As dificuldades são o sal da vida.» (A Caminho do Triunfo, p17).


Desde os finais dos anos oitenta que o CNE optou pela presença do Homem Novo, inspirado em São Paulo, nessa fase só para os Caminheiros, mas com a revisão do programa educativo operada em 2009 este percurso do Homem Novo foi alargado a todas as Secções. Assim, o Lobito louva o Deus-Criador, descobrindo-O no que o rodeia, o Explorador aceita a Aliança que o conduz à descoberta da Terra Prometida, o Pioneiro assume o seu papel na construção da Igreja de Cristo e o Caminheiro vive cristãmente em todas as dimensões do seu ser.

A presente crónica ao ser publicada na Sexta-feira Santa, não podia deixar de abordar a problemática da educação para a paz, tão cara a Baden-Powell, e que constituiu a espinha dorsal do Projeto Educativo do CNE. Os tempos de hoje obrigam-nos, por imperativo de consciência a olharmos para Leste e a partilharmos a dor do povo ucraniano. Hoje, vítima de uma guerra injusta, como todas as guerras, onde o mais forte, leia-se detentor de maior arsenal militar, maltrata aqueles que se tinham preparado para viver em harmonia e paz.


Neste contexto, como fazem sentido as palavras do fundador na sua última mensagem: “Creio que Deus nos colocou neste mundo encantador para sermos felizes e apreciarmos a vida” e ainda: “Mas o melhor meio para alcançar a felicidade é contribuir para a felicidade dos outros. Procurai deixar o mundo um pouco melhor do que o encontrastes”. Como devem ser infelizes aqueles soldados e mercenários que invadiram a Ucrânia e muitíssimo mais ainda aquele que determinou a invasão deste país independente. Observando para esta situação só me ocorrem duas frases a primeira de Martin Luther King - “o que me preocupa não é o grito dos maus, mas sim o silêncio dos bons” e a segunda que foi uma súplica de Jesus, já no alto da cruz: “Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem”.



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